Futuro sombrio
O Diário de Notícias de hoje traz uma reportagem inquietante.
"Doutores em Saldo" é o título. Um conjunto de 5 jovens com idades compreendidas entre os 23 e os 30 anos. Todos a trabalhar mas nenhum a exercer funções para as quais de formou. A remuneração auferida varia entre os 300 e 600 euros mensais. São cinco exemplos em milhares existentes. Pior estão os cerca de 42.000 licenciados no desemprego (segundo o DN, valores de 2005). Um pormenor: destes cinco, dois são licenciados em Comunicação (Ciências da Comunicação e Jornalismo) e um está a frequentar mestrado em Comunicação. Todos licenciados pelo ensino público.
Imaginem como não estão os milhares de jovens que frequentam actualmente as inúmeras licenciaturas na área da comunicação e jornalismo (só no ISMAI, caso que conheço melhor, são 70 alunos e o curso de Ciências da Comunicação apenas nasceu no ano passado). Aqueles que querem seguir uma carreira no Jornalismo terão de fazer muito bem as contas. A concorrência é feroz - o acesso à carreira dispensa licenciaturas e nestas, qualquer uma serve, a bem dizer, para o exercício da profissão.
Além disso, o jornalismo está em crise profunda. A concentração empresarial do sector agrava a situação. Temos poucos diários e todos eles em fase de diminuição de postos de trabalho (o Público é o último exemplo). Poucas televisões e as que temos não querem jornalistas, querem caras bonitas. Já faltou mais para termos a "Miss MaxMen" a apresentar o jornal da noite. As rádios podem ser o último refúgio mas mesmo aqui, não abunda trabalho. Um bom exemplo é a Rádio Clube Português (90.0 FM, no Porto) - experimentem sintonizar e depois digam de vossa justiça...
Por outro lado, o mercado é muito pequeno. Os portugueses não são "compradores" de jornais, o que é diferente de "leitores". O português até lê jornais. O jornal mais lido em Portugal é o famoso "Jornal da Casa", aquele que existe em quase todos os cafés e tascos, a versão mais antiga do "jornal gratuito". Depois temos os jornais lidos na Net, principalmente no escritório da empresa em horas de expediente. Ou seja, o português adora as borlas. "Borlix, não custa Nix" como anunciava a Clix.
O "jornal da casa", as revistas do consultório do senhor doutor e a Web da empresa são a prova provada que o português consome jornais e revistas. Desde que sejam de borla. Mas atenção: querem qualidade. "Destak"? "Metro"? Só para passar o tempo. Bom, bom é o DN ou o JN ou ainda a Turbo "que eu li no dentista".
E agora? Agora os filhos estão no desemprego.
6 comentários:
Isso é tudo verdade...mas também quantos dos candidatos a jornalistas sabe exactamente o que é ser jornalista?
Por outro lado é um erro associar directamente "Ciências da Comunicação" a jornalismo.
A comunicação é uma área muito mais lata que a comunicação social.
Aliás, etimologicamente falando, a ciência que deveria suportar um jornalista deveria, antes de tudo o mais, ser uma ciência da informação e não da comunicação. O informar tem regras muito mais exigentes do que o comunicar. O cão do meu vizinho comunica mas não me informa de nada.
Permitam-me discordar da última afirmação do sr.mario nuno neves. Não concordo quando afirma que informar tem regras muito mais exigentes do que comunicar e muito menos quando diz que o cão do vizinho comunica mas não o informa de nada.O Prof.Dr. Jorge Marinho, docente de Psicossociologia da Comunicação na Faculdade de Letras da UPorto, diz que "só há comunicação quando há partilha de significação. Se não houver pontos em comum, não se pode falar em comunicação". Ou seja, a comunicação está intimamente ligada à percepção. Se a mensagem transmitida pelo emissor não puder ser descodificada pelo receptor, não podemos falar em comunicação. Não há uma transmissão eficaz da mensagem. O cão poderá, quanto muito, comunicar com o ser humano não-verbalmente, algo que tem vindo a ser estudado por diversos profissionais das áreas da biologia, zoologia e ciências da comunicação lato sensu.
Quanto à distinção entre informação e comunicação: informação é um conceito quantitativo e comunicação um conceito qualitativo; a informação é objectiva, levando a que a comunicação seja como que a arte de trabalhar a informação para torná-la acessível a diversos tipos de audiência, dado que uma mesma informação pode ser compreendida diferentemente por diversas pessoas. O ser humano depende, assim, na hora de interpretação de uma informação, da percepção, experi~encia pessoal, da sua expectativa perante a mensagem e o seu assunto e do envolvimento emocional com a mesma. Ou seja, uma única mensagem pode ser entendida de 1001 formas diferentes. Assim, não podemos abordar de uma forma tão redutora uma área do saber como a comunicação que, apesar de recente comparativamente às demais, tem uma importância crucial nas nossas vidas. No entanto, manifesto a minha concordância com o senhor MNN quando afirma que muitos dos candidatos a jornalistas não sabem o que os espera. A informação sobre os cursos está disponível em todo o lado, mas sobre eles ainda subsistem demasiadas falhas de comunicação..;)
"Doutores em saldo". Excelente título para um artigo cuja autora escreve, na página 3: "Diz isto indiferente ao espanto que causa em quem a houve." Houve? Houve? Não será "ouve"??? Até admito que a jornalista seja muito jovem e impreparada, que não domine bem a língua portuguesa, que não saiba distinguir a conjugação do verbo haver com a do verbo ouvir, mas alguém com responsabilidade devia ter mais cuidado e não permitir que erros grosseiros destes sejam dados à estampa.De fugir!
Tem razão, a reportagem é mesmo inquietante, até porque há mais um doutora em saldo, a que assina aquele texto e escreve assim: "indiferente ao espanto que causa em quem a houve". (ouve, obviamente). Imagino que a jornalista também terá ficado indiferente ao espanto de quem a lê.
Ler jornais assim não é saber mais...
A Comunicação "não verbal" é real. O cão comunica, dando sinais, nomeadamente de que está irritado ou com fome. Não me informa é sobre o que lhe apetece comer ou sobre aquilo que o incomoda.
Comunicar é mais simples e mais básico do que informar, até porque a comunicação pode ser efectuada até por simples sinais corporais. A informação, a partilha inteligível de um facto é muito mais complexa e exige regras precisas.
Acabou a formação para o emprego. Hoje tiram-se cursos para a empregabilidade. E não está mal.
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